Leia o artigo de Wil Delarte, colunista do Cotia e Cia
Foto: Tânia Rego/Agência Brasil |
Enquanto a Bolsa de Valores despenca, já no primeiro dia do governo Luiz Inácio, abro esse artigo com uma frase histórica da nova Ministra da Cultura, Margareth Menezes, proferida em seu discurso de posse nesse dia 02/01/23, fazendo renascer das cinzas, com uma mitológica ave Fênix, todo um Ministério:
“O novo Minc será central no processo de reencantamento do nosso país que foi propositadamente desencantado”, disse Margareth, enfática.
Sublinha-se: o Minc havia sido propositalmente reduzido à Secretaria pelo antigo governo, como gesto de sabotagem e desprestígio, e entregue a ideológicos lunáticos e pessoas sem qualquer noção de Cultura e Brasilidade, dentro daquilo que podemos chamar de "treva cultural", ou seja, os últimos quatro anos do necropolítico governo Bolsonaro. Entenda-se como “necropolítico”, um governo que tinha como meio e fim a morte (literal e simbólica), a destruição das instituições e da própria Democracia, como já bem trouxe aqui no artigo “Uma Carta de Amor à Constituição”.
Enquanto a Bolsa cai, o Minc e o Brasil renascem na diversidade.
Eu, como homem da Arte e da Cultura, não posso deixar de apontar essa reviravolta, esse renascimento e reencantamento. Sei o quanto essa ala da sociedade, como tantas outras, aliás, sofreu com o descaso, o quanto a pandemia foi cruel com artistas e com quem vive da Arte e da Cultura nesse país, o quanto demorou a termos qualquer tipo de incentivo, como os da Lei Aldir Blanc, quando muito, e tardiamente. A ideia, sim, era nos matar. E muitos se foram, muitos órfãos nasceram nesse Brasil necropolítico dos últimos quatro anos.
Mas enquanto a Bolsa cai, várias Fênix renascem... Fênix na Educação. Fênix na Igualdade Racial. Fênix no Ministério das Mulheres.
Um novo Ministério, o dos Povos Indígenas, se ergue nos braços de Sônia Guajajara, primeira indígena a ocupar um cargo assim no país.
E não é muito dizer que outras Fênix também retornam dos escombros: a FUNAI, o IBGE, o INCRA, o IBAMA, e tantos outros institutos destruídos, marginalizados, e estrategicamente desprestigiados pelo Brasil necropolítico dos últimos quatro anos.
Enquanto o Brasil se levanta do coma, farialimers mordem o mouse, ajeitando suas jaquetas.
Enquanto a Bolsa cai, o Brasil renasce de um surreal e distópico Furacão. “Anistia, não!”, foram os gritos recorrentes do povo durante os discursos da posse histórica e emocionada de Luiz Inácio.
Bolsonaro segue em sua fuga, chorando e à míngua, covarde, como sempre foi.
Reencantar o desencantado é fazer renascer a noção de Justiça num país, missão tão árdua dada às mãos agudas e lúcidas de Flávio Dino, novo Ministro da Justiça e Segurança Pública.
Reencantar o desencantado é também dar voz à Marina Silva e ao Ministério do Meio Ambiente, e ver o Brasil ganhar novamente protagonismo nessa matéria que tanto é cara ao próprio futuro do mundo.
Enquanto a Bolsa cai, a Fênix da Saúde sobrevoa o planalto com Nísia Andrade, presidente da Fio Cruz e porta voz da resistência da Ciência durante toda a pandemia.
A Bolsa cai e espera ouvir do professor Fernando Haddad o mesmo discurso neoliberal, e perversamente fascistóide, de um metafórico “Posto Ipiranga” qualquer. A Bolsa cai e não quer aceitar a ideia básica de que “equilíbrio fiscal” também se faz com “responsabilidade social”, né.
Após a intensificação da miséria e da desigualdade, promovida por um governo neofascista de extrema direita, o “Governo Lula 3.0” vem, como os mais jovens diriam, "on fire", quer dizer, pegando fogo! Por tudo o que vimos até aqui, em discursos históricos, potentes e simbólicos, ministros e ministras surgem com verbo afiado, radical empatia, e muito sangue nas veias e nos olhos.
Um governo que não é mais do Luiz Inácio, nem mesmo de sua frente ampla de governabilidade: é um governo, em seus primeiros dias, de vozes secularmente caladas, de vozes que encontraram seu tempo e urgência.
Como diria o ditado yorubá, citado em seu discurso de posse por Sylvio Almeida, esse enorme intelectual negro e novo Ministro dos Direitos Humanos e Cidadania: Exu continua acertando o pássaro de ontem com a pedra de hoje! Quer dizer, continua revelando a todos as nuances, as matizes e motivações do passado, e o hoje e o amanhã, por sua vez, se imbricam numa Encruzilhada de movimento sem volta. Como lindamente também disse o próprio Sylvio Almeida, nesse que foi, talvez, o melhor discurso nessa sequência de discursos históricos, “a verdadeira paz será aquela construída com Verdade, com o cultivo da Memória e realização da Justiça”. Pra terminar, arremata: “Nós somos a vitória dos nossos ancestrais e a vitória dos que virão depois de nós”.
É assim, enquanto a Bolsa cai, um novo Brasil com cara de Brasil, plural e diverso, sobe a rampa.
Feito Fênix.