Em 2020, Prefeitura e MP receberam denúncias do asilo clandestino em Caucaia do Alto

Na época, Vigilância Sanitária de Cotia constatou diversas irregularidades; com outros “sócios”, atividades ilícitas continuaram na residência que só foi fechada nesta quinta-feira (6), após graves denúncias de maus-tratos contra 26 idosos; casal preso em flagrante seria caseiro da proprietária do local

Clínica clandestina foi fechada nesta quinta-feira (6). Foto: Reprodução / Edição: Cotia e Cia 


Reportagem: Neto Rossi


A residência em que funcionava um asilo clandestino, dentro do condomínio Colonial Village, no distrito de Caucaia do Alto, em Cotia, já havia sido denunciada à Justiça no ano de 2020 por exercer atividades de forma irregular com idosos. 

Cotia e Cia teve acesso a um processo de mais de 400 páginas que detalham todas as denúncias que foram realizadas na época. 

O local foi fechado nesta quinta-feira (6) pela Prefeitura de Cotia após flagrante de maus-tratos a 26 idosos – uma mulher de 76 anos morreu. Duas pessoas, que seriam caseiras da proprietária do imóvel, foram presas em flagrante (leia mais detalhes no decorrer da reportagem). 


Uma das denúncias enviadas ao Ministério Público, em 2020, foi feita pela Associação dos Proprietários do Loteamento Colonial Village (APLVC). Em decorrência da denúncia, foi instaurada Ação Civil Pública.

Na ocasião, oito idosos estavam abrigados no local. Segundo a promotora do Ministério Público, Camila Teixeira Pinho, um casal e a proprietária do imóvel, Jarilânia Melo de Assis, eram os responsáveis por fazer funcionar o asilo clandestino. O local, segundo a promotora, era totalmente inadequado para esse fim, sem licença dos órgãos municipais e de saúde, sem equipe técnica e sem plano de atendimento individualizado.

Ainda segundo a promotora, o local não possuía alvará de funcionamento, projeto arquitetônico aprovado pela Vigilância Sanitária Municipal, auto de vistoria do Corpo de Bombeiros e nem estava cadastrado na Secretaria de Desenvolvimento Social e/ou Conselho Municipal do Idoso.

Além disso, o imóvel não tinha regimento interno, plano de trabalho, plano de atenção integral à saúde e nem serviços de alimentação, limpeza e lavanderia. Ou seja, segundo a promotora, a entidade mantida pelo trio não atendia qualquer requisito para funcionar.

VISTORIA DA VIGILÂNCIA SANITÁRIA

Após o recebimento das denúncias, em novembro de 2020, a Vigilância Sanitária de Cotia foi ao local realizar a vistoria e constatou o desenvolvimento de atividades irregulares na residência.

Trecho do processo de 2020. 



Na oportunidade da fiscalização, a Vigilância apurou que havia realmente oito idosos no imóvel, sem que fosse apresentada documentação ou prontuário dos pacientes.

Diante disso, a Vigilância Sanitária determinou ao trio responsável pelos idosos que mostrasse a relação das pessoas acolhidas, bem como os encaminhassem às famílias ou a outra entidade regular.

No entanto, segundo o Ministério Público, a determinação não foi cumprida e eles continuaram desenvolvendo as atividades irregularmente, desrespeitando a interdição da Vigilância Sanitária.

Na ação, a promotora Camila determinou a transferência dos idosos para instituições legalmente constituídas ou para os respectivos núcleos familiares, no prazo de 48 horas, sob pena de multa diária no importe de dez salários mínimos.

DEFESA DO CASAL E DA JARILÂNIA

O advogado do casal e de Jarilânia afirmou no processo que os familiares dos idosos aprovaram a permanência deles na instituição. Mas diante da fiscalização e das irregularidades apontadas pelo MP e pela Vigilância Sanitária, eles acabaram se desligando das atividades, que foram encerradas, desde então.

De acordo com o advogado, os idosos que lá estavam voltaram para as suas famílias. “O Sr Oficial de Justiça colheu as informações e telefones dos familiares, tendo assim a devida localização dos mesmos, ficando a requerida apenas com prejuízos e sem saber para onde os familiares os conduziram”, diz no processo.

O advogado ainda apresentou um documento para a Vigilância Sanitária dizendo que a denúncia formulada ao Ministério Público foi devido a um problema que existia entre Jarilânia Melo de Assis – proprietária do imóvel - e a Associação dos Proprietários do Loteamento Colonial Village. Segundo ele, a denúncia não tinha sido feita para a proteção dos idosos, “mas para atingir Jarilânia”, como uma espécie de “vingança”.



O advogado finaliza dizendo que o casal encerrou a locação e entregou o imóvel para Jarilânia.

Jarilânia Melo de Assis. Foto: Arquivo pessoal 



IMÓVEL CONTINUOU SERVINDO DE ASILO CLANDESTINO

Após a saída do casal, Jarilânia teria alugado o imóvel, em março de 2021, para Gerônima Dias Barbosa e seu companheiro Maurício Alves da Silva. Mas Cotia e Cia apurou que Jarilânia disse a um oficial de justiça que os dois eram seus caseiros. Veja abaixo:



Gerônima e Maurício foram presos em flagrante nesta quarta-feira (5), acusados de maus-tratos a 26 idosos que estavam em condições precárias dentro da residência.

A continuidade do serviço clandestino dentro do imóvel foi descoberta após uma idosa de 76 anos morrer no local. Maria Juviniano dos Santos foi levada já sem vida ao Pronto Atendimento de Caucaia do Alto, segundo informou uma testemunha ao Cotia e Cia.

A reportagem questionou o Ministério Público o motivo de o órgão não ter supervisionado o local e nem ter feito mais diligências, uma vez que o mesmo imóvel já havia sido alvo de denúncias de irregularidades em 2020, conforme mostrou a reportagem.

Cotia e Cia também entrou em contato com a Prefeitura de Cotia para saber o porquê não houve, neste período, de quase um ano, fiscalização no local, sendo que já era de ciência dos órgãos competentes do município tais atividades ilícitas na casa.

O MP disse ao Cotia e Cia que a promotora do caso, Camila Teixeira Pinho, estava de férias. Já a Prefeitura de Cotia informou que está fazendo o levantamento das documentações para poder formalizar o posicionamento.

As respostas, tanto do Ministério Público quanto da prefeitura, serão publicadas assim que elas forem enviadas ao site.

Em nota, a Associação dos Proprietários do Loteamento Colonial Village (APLVC), condomínio onde estava instalado o asilo clandestino, esclareceu que o perímetro do loteamento está inserido em zona residencial, portanto, conforme previsto em seus estatutos, “é expressamente proibida a prática de qualquer atividade comercial no interior do loteamento”.

“Desse modo, assim que chegou ao conhecimento de sua diretoria o funcionamento clandestino do lar de idosos em suas dependências, [a associação] tomou todas as providências judiciais ao seu alcance para coibir dita prática”, disse.

A APLVC também relembrou que em 2020 encaminhou ao Ministério Público a denúncia acerca das atividades clandestinas do local e declarou que “repudia veementemente qualquer prática ilícita, especialmente no perímetro do Loteamento Colonial Village”.

Na tarde desta sexta-feira (7), Cotia e Cia ligou para Jarilânia Melo de Assis, proprietária do imóvel, mas não conseguiu fazer contato.

NOTA DO COTIA E CIA

Para fazer essa reportagem, Cotia e Cia acessou um processo de mais de 400 páginas que contém todas as informações e as denúncias. 
Postagem Anterior Próxima Postagem