Segundo os profissionais, os 10% do salário-base, garantido por lei, não foi concretizado; sem férias, cansaço e estresse tomam conta da rotina dos servidores concursados das unidades de saúde do município
Segundo o relato, 29 servidores da saúde passam pela mesma situação. Foto: Reprodução |
Representantes de um grupo formado por 30 enfermeiros concursados, que trabalham em unidades de saúde de Cotia, relataram à reportagem do Cotia e Cia que a categoria está sem receber os 10% da função gratificada, garantida por lei, e que também estão sem previsão de férias.
Sobre a função gratificada, um documento exigindo o pagamento, feito pela coordenação de enfermagem e contendo a assinatura dos servidores, teria sido entregue no começo do ano para o secretário de Saúde de Cotia.
Em outubro de 2019, o prefeito Rogério Franco sancionou uma lei complementar onde é instituído 10% do salário-base para a categoria. A lei cria funções gratificadas para seis apoiadores de enfermagem na Atenção Básica, 30 enfermeiros Responsáveis Técnicos e 15 supervisores técnicos. Mas, segundo as declarações dos funcionários, todos estão recebendo, exceto os enfermeiros Responsáveis Técnicos.
“Nós fomos inclusos na função gratificada com 10% do salário-base, desde outubro de 2019, e até o momento, não conseguimos receber esse direito. Fizemos até um documento que foi entregue para a coordenação, mas não tivemos nenhuma resposta”, disse Rafaela*.
Trecho da lei complementar que garante o benefício aos servidores da saúde |
No documento os profissionais reivindicam o benefício e afirmam que outras categorias foram contempladas com o mesmo. Eles também questionam uma informação que fora passada em reunião. “Nos foi falado em reunião que a lei contemplava apenas 26 Responsáveis Técnicos, e precisava ser revisado esse quantitativo que seria gratificado, incluindo outras categorias que reivindicavam o cargo. Não subestimem nossa inteligência, por favor”, diz trecho do texto que o Cotia e Cia teve acesso.
Eles explicaram que, como diversas pessoas recebiam gratificação sem justificativa, foi criada a lei complementar, em outubro do ano passado, com as funções gratificadas, sendo enfermeiro apoiador com 70% de gratificação, coordenadores com 85% e enfermeiro Responsável Técnico (RT) com 10%. Porém, segundo eles, dos 30 profissionais, apenas um enfermeiro RT conseguiu receber o benefício.
“Estranho é que apoiador e coordenador começaram a receber no mês seguinte, ou seja, recebem desde novembro de 2019, e nós enfermeiros nada até o momento”, reivindicou Regina*.
Os enfermeiros responsáveis técnicos estão espalhados por todas as unidades de saúde do município. São eles quem coordenam e organizam as equipes de profissionais que atuam nos postos.
A Secretaria de Saúde de Cotia foi procurada para dar um posicionamento sobre esse problema, mas não retornou dentro do tempo estipulado.
Já o Sintrasp, sindicato que representa os servidores públicos de Cotia, disse em nota que não recebeu manifestação de cobrança do não pagamento das gratificações por parte dos servidores da saúde. No entanto, o sindicato garantiu que vai averiguar a situação junto a administração municipal para saber o que ocorreu.
Férias: sem previsão
Os relatos dos enfermeiros ouvidos pela reportagem não são apenas sobre as gratificações. Outro problema apresentado por eles está relacionado as férias que, até agora, não há previsão.
Um decreto publicado em março deste ano pelo governo municipal suspendeu as férias dos servidores da Secretaria de Saúde de Cotia por conta da pandemia. No entanto, desde a publicação do decreto, segundo os profissionais, a prefeitura não comunicou quando as férias seriam restabelecidas.
Rafaela explica que o estresse toma conta do trabalho e da rotina dos profissionais de enfermagem, e, sem descanso, a situação se agrava mais. “Todos municípios já liberaram férias aos servidores, e aqui sem previsão. Vamos adoecer assim. Temos família e merecemos descanso. Cuidamos da população, se adoecermos, será pior. Muitos, inclusive, já se afastaram com licença médica”, relata.
Segundo Beatriz*, apenas os servidores concursados é que não tiveram, ainda, o direito às férias. “Tem um pessoal [da Secretaria de Saúde] que não é concursado que está tirando férias normalmente. Mas quem é concursado, está com férias suspensa por tempo indeterminado”, reclama.
Além de não saberem quando terão o direito ao descanso, Josefa* explicou que nem mesmo as faltas abonadas, em que o servidor não sofre desconto pelo dia não trabalhado, eles conseguiram tirar. “Durante um tempo, a coordenação também não estava permitindo a gente tirar falta abonada, falava que não podia. A gente nunca tem nada por escrito, até hoje não temos um documento por escrito que nos informe até quando vai essa questão de não ter férias. É bem difícil.”
Novamente procurada pela reportagem, a Secretaria de Saúde de Cotia não retornou até a conclusão deste texto. Caso haja retorno sobre as situações relatadas pelos profissionais da enfermagem, ele será acrescentado aqui.
O Sintrasp, sindicato que representa a categoria, disse que encaminhou ofício ao prefeito de Cotia no dia 21 de setembro, solicitando a revogação da suspensão das férias dos servidores da saúde, assim como também da segurança pública e administração de cemitérios. Mas não houve retorno do governo.
“Neste momento, com a segunda onda do surto de covid-19, entendemos que dificilmente será atendida essa pretensão dos servidores da saúde, mesmo tendo eles todo direito em gozar de suas referidas férias”, concluiu o Sintrasp na nota.
* Os nomes foram modificados a pedido dos entrevistados por medo de sofrerem retaliações.
Reportagem de Neto Rossi
(Essa reportagem foi atualizada às 16h30 do dia 17/12/2020 com a nota do Sintrasp)